quinta-feira, 20 de setembro de 2012

A prova por "ouvir dizer" no Júri

No filme "Carandiru", o personagem conhecido pelo vulgo "Barba", quando perguntado a respeito do crime pelo qual estava sendo acusado, disse: "Alguns dizem que fui eu, mas não viram, outros dizem que viram que eu não fui". Mesmo na dúvida, "Barba" estava encarcerado. Essa situação repete-se diuturnamente na área criminal.
Muitos crimes dolosos contra a vida não são praticados na presença de testemunhas, mas em face da gravidade desses delitos a polícia sempre precisa de um suspeito, que costuma ser o primeiro que aparecer. Logo surgem as denúncias anônimas e as testemunhas indiretas, aquelas que não viram quem foi, mas  "ouviram dizer".
Relatado o inquérito policial, via de regra, o Ministério Público encampa a tese levantada pela polícia e termina por denunciar o suspeito. No decorrer da instrução, quando as testemunhas aparecem, afirmam: "Ouvi dizer que foi ele"; "Disseram que foi ele", etc. Isso se deve, boa parte da vezes, aos familiares da vítima.
É comum que, encerrada a instrução, o Magistrado, mesmo sem ter a certeza de que o acusado participou do crime, se utilize do malfadado in dubio pro societat para pronunciá-lo e encaminhá-lo a julgamento pelo Tribunal Popular. Atuam, nesse ponto, tal como Pilatos, sem pensar nos riscos de uma decisão injusta por parte dos jurados.
Durante o julgamento, embora reconheçam que não há provas, podem os jurados decidir com base nos antecedentes do acusado, na aparência, na má impressão causada pelo uso de algemas e pelas roupas do presídio, e em muitos outros detalhes alheios à prova dos autos. Tem-se então uma decisão injusta, que poderia ter sido evitada.
Caberá ao advogado interpor recurso de apelação, sustentando que a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, objetivando conseguir um novo julgamento. Há precedentes que desconsideram os depoimentos prestados por testemunhas indiretas.
Vejamos um exemplo: "[...] Diante de tal contexto, de se concluir que a decisão dos senhores jurados, amparada tão somente na palavra das testemunhas que supõe que o recorrente tenha participado do delito, contrariou os elementos de convicção reunidos, de modo que o julgamento deverá ser renovado" (TJSP, Apel. n.º 0000579-03.2005.8.26.0606, Rel. Des. Francisco Menin, J. 28.04.2011).
Os romanos diziam que "A testemunha deve depor sobre o que sabe e o que presenciou e não com base no sentir de outrem". Os americanos não admitem o testemunho indireto, asseverando que "Ouvir dizer não é evidência". Aqui o testemunho indireto é admitido, mas é possível argumentar em sentido contrário, especialmente no Júri.

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