quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Prisão e fundamentação

Quando se fala em prisão provisória nos Tribunais Superiores, boa parte das discussões giram em torno da fundamentação da decisão que a decretou. Não é preciso muito tempo de advocacia para perceber que não adianta muito insistir naquela ladainha de "primário, com bons antecedentes, residência fixa e ocupação lícita", notadamente quando se trata de crimes hediondos ou equiparados.
De acordo com o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, todas as decisões judiciais devem ser fundamentadas, sob pena de nulidade. Modernamente, já não há mais espaço para decisões alicerçadas em argumentos genéricos como a gravidade abstrata do crime ou a periculosidade do agente. O Magistrado precisa indicar fatos concretos que recomendem a decretação ou manutenção da custódia.
Especialmente em se tratando de habeas corpus, deve o advogado dedicar-se a analisar e discutir a fundamentação da decisão combatida. Dada a quantidade de trabalho, muitos juízes se utilizam de modelos carentes de fundamentação, aplicáveis a todo e qualquer caso, e isso não pode, em nenhuma hipótese, ser ignorado pelo advogado, que precisa buscar o reconhecimento da nulidade.
Como de costume, não pretendo me ater às questões doutrinárias relacionadas à necessidade de fundamentação das decisões judiciais. Basta dizer que uma decisão carente de fundamentação é nula e que devemos insistir até o fim para vermos reconhecida a nulidade, principalmente quando nos dirigimos aos Tribunais Superiores, que costumam dar à Constituição a sua devida importância.
Consoante destacou o Ministro Ayres Brito no julgamento do habeas corpus n.º 110.844/RS: "[...] a garantia da fundamentação importa o dever judicante da real ou efetiva demonstração de que a segregação atende a pelo menos um dos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal". Apelos retóricos à gravidade do crime ou à suposta periculosidade do agente não satisfazem a exigência constitucional.
O ataque à fundamentação das decisões pode funcionar como uma bala de prata, principalmente quando a ladainha de "primário, com bons antecedentes, residência fixa e ocupação lícita" não for aplicável ao cliente. Até mesmo a decisão que decreta a prisão cautelar do pior dos criminosos deve estar assentada em fundamentação suficiente e idônea, sob pena de nulidade, como já destacado.
É muito importante insistir. Certa feita conseguimos uma decisão liberatória através de um agravo regimental no Superior Tribunal de Justiça. Dois writs foram denegados no Tribunal de Justiça, um foi denegado e o último sequer foi conhecido no Superior Tribunal de Justiça, pois a essa altura já havia sentença no processo de origem. O agravo de instrumento em face dessa última decisão deu resultado.
Quando o Magistrado nega ao acusado o direito de recorrer em liberdade em sede de sentença, o julgamento do habeas corpus anterior costuma ficar prejudicado e por essa razão o segundo writ não foi conhecido. Argumentamos, no agravo, que a sentença não estava suficientemente fundamentada no que tange à manutenção da prisão e, portanto, era nula e não substituía a decisão anterior.
Houve êxito no Superior Tribunal de Justiça, mas os Tribunais de Justiça não costumam dar muita importância à questão da fundamentação, por isso digo que é importante insistir até o fim, interpondo os recursos cabíveis até a obtenção de uma decisão favorável. Nos casos mais graves a situação dificilmente se resolve no primeiro habeas corpus, e muitas vezes nem mesmo no segundo.

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